24 de abril de 2012
Irresponsabilidade, comodismo, desídia, desrespeito aos cidadãos,
desprezo pelo meio ambiente. Qualquer dessas expressões retratará com perfeição
o comportamento das autoridades municipais do Rio de Janeiro que, nos últimos
34 anos, criaram, utilizaram e trataram de fazer crescer rápida e
ininterruptamente o aterro sanitário de Jardim Gramacho, no município de Duque
de Caxias, até o transformarem no maior lixão do continente e uma espécie de
bomba-relógio de poluição que ameaça a Baía de Guanabara. O caso do lixão de
Jardim Gramacho é, certamente, o mais impressionante de todos, mas é mais um
entre os muitos erros acumulados ao longo dos anos pelo poder público no
tratamento dos resíduos sólidos gerados nas cidades.
Ocupando uma área de 1,3 milhão de metros quadrados, o lixão de Gramacho
acumula 60 milhões de toneladas de lixo, cujo volume alcança até 60 metros de
altura, colocados sobre um solo de pouca firmeza.
A decomposição do material orgânico contido nessa montanha de lixo
produz o chorume, líquido poluente de cor escura e odor nauseante, que vaza
para as águas da Baía de Guanabara. A decomposição desse material produz também
o gás metano, um dos responsáveis pelo efeito estufa e que, de tempos em
tempos, provoca explosões no lixão. Localizado a 4 quilômetros do Aeroporto Tom
Jobim, o lixão tornou-se uma ameaça à segurança dos voos, por causa do grande
número de urubus que atrai e que disputam com as pessoas os resíduos ali
depositados.
"Cometeu-se um crime ambiental monumental no Rio de Janeiro",
reconheceu o secretário municipal de Conservação, Carlos Osório, em entrevista
à repórter Clarissa Thomé, do Estado (22/4). Trata-se, de fato, de um crime
ambiental, praticado continuamente pelas autoridades municipais durante
décadas. Finalmente, essas autoridades se dizem dispostas a corrigir os males
que causaram.
Embora sua gestão não possa ser responsabilizada pelo descaso com o
lixão de Jardim Gramacho, o atual prefeito, Eduardo Paes, já poderia ter
resolvido o problema há mais tempo, pois está no cargo desde o início de 2009.
É provável que, mais do que consciência ambiental ou tardia demonstração de
senso de responsabilidade, o que move as autoridades cariocas seja um
raciocínio eminentemente político.
A Prefeitura do Rio quer anunciar o início da desativação do aterro de
Jardim Gramacho em maio, nas vésperas da conferência mundial Rio + 20, durante
a qual poderiam apresentar o caso como um modelo de substituição de um lixão a
céu aberto por um sistema moderno de aterro sanitário. Não parece tarefa fácil,
porém, convencer especialistas internacionais de que, depois de tanto tempo sem
demonstrar nenhuma preocupação especial com o meio ambiente, de repente a
Prefeitura do Rio se tornou uma campeã da proteção ambiental e da
sustentabilidade - tema central da Rio + 20.
É urgente, e não de hoje, desativar o Jardim Gramacho e outros lixões
criados no País. A desativação, exigida pela necessidade de preservação
ambiental e proteção da saúde da população, tornou-se exigência legal, com a
instituição, em 2010, da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Essa política
determina que, até 2014, todos esses lixões devem ser substituídos por aterros
com preparo no solo, para evitar que o lençol freático e outros recursos hídricos
sejam contaminados pelo chorume, e com equipamentos para a queima do metano
para a geração de energia.
No fim da década de 1990, a Companhia Municipal de Limpeza Urbana
(Comlurb), responsável pela operação do Jardim Gramacho, instalou sistemas de coleta
e tratamento do chorume. Desde o ano passado, vem sendo reduzido o volume
depositado no lixão. O projeto de recuperação da área prevê a abertura de mais
poços de captação do metano. Purificado, o gás será vendido para a Refinaria
Duque de Caxias, que o empregará na geração de energia para consumo próprio. O
lixo coletado na cidade será levado para o Centro de Tratamento de Resíduos de
Seropédica, a 75 quilômetros do Rio, onde será coberto após o despejo.
Ainda que tardiamente, anuncia-se a desativação da ameaça à Baía de
Guanabara.
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